CAP. 5: A SOLIDÃO DO PODER

Se tivesse a exata noção das dificuldades que teria pela frente, talvez Ezequiel Simone não houvesse dedicado boa parte do seu tempo à nova função que acabou, involuntariamente, por abraçar. Eram tantas as atribuições, tantas os afazeres, que o dinheiro necessário para colocar o clube em funcionamento, mesmo sendo muito, transformou-se no menor dos seus problemas.

A primeira promessa que fez, porém, ele cumpriu à risca. Em poucos dias, graças ao patrocínio do seu primeiro presidente, a Società Palestra Itália já estava devidamente registrada como firma, o que hoje seria equivalente à abertura de uma empresa. Em outras palavras: nosso clube já tinha, então, o status de pessoa jurídica. Este detalhe parece irrelevante, mas na verdade não o é: para montar um time e poder disputar o Campeonato Paulista, maior ambição dos palestrinos desde sua fundação, seria necessário que todo o processo burocrático fosse cumprido à risca.

Mas foi a partir de então que os problemas de Simone e dos outros três rapazes aumentaram. Como dissemos, ao todo foram 46 os homens que assinaram a ata de fundação do clube e, com exceção daqueles que compuseram o primeiro corpo diretivo – o próprio presidente, Cervo, Marzo, Ragognetti e mais uns dois ou três jovens -, todos os demais ficaram, de início, à margem das principais decisões.

Ezequiel Simone sentiu na pele o quanto é duro presidir um clube de colônia

Ora, todos nós conhecemos o espírito e o temperamento do italiano em geral. Não serem consultados sobre seja lá o que fosse começou a gerar entre os que não faziam parte da diretoria um clima de insatisfação, que foi crescendo numa velocidade espantosa. Nas reuniões, que aconteciam quase que diariamente no mesmo Salão Alhambra que viu o Palestra nascer, as discussões eram cada vez mais comuns e, pior, ásperas, não demorando para que os mesmos que aplaudiram e deram vivas ao novo e primeiro presidente passassem a criticá-lo e, até mesmo, a considerá-lo um ditador.

Vincenzo Ragognetti, Ezequiel Marzo e Luigi Cervo tentaram o quanto puderam fazer o papel de pára-raios de Ezequiel Simone. Lembravam aos insatisfeitos, a todo instante, que o presidente só ocupara o posto porque todos os outros 45 fundadores nele o haviam colocado. E mais: as decisões não eram tomadas unilateralmente, já que tudo o que precisava ser feito contava com o aval dos rapazes e, como dissemos, de mais dois ou três integrantes da diretoria. De nada adiantou: o mesmo sucesso que tiveram ao fundar um clube de futebol não foi obtido no ato de persuadir os rebelados.

Pressionado, criticado, sem muitas alternativas para resolver tal situação e percebendo que a cada dia o Palestra lhe tomava mais tempo e que, com isso, seus negócio começavam a ficar em segundo plano, Ezequiel Simone sentiu rasgar a pele a solidão à qual o poder muitas vezes relega aqueles que o detêm. Assim, apenas 19 dias depois de ter tomado posse, decidiu em carta assinada e entregue à diretoria, datada de 8 de novembro de 1914, renunciar a seu mandato em caráter irrevogável.

Acéfalo com poucos dias de existência, o Palestra Itália viu seu destino tornar-se sombrio, e houve quem apostasse que o clube sequer completaria um mês de vida. Contudo, novamente os três rapazes do bairro do Brás arregaçaram as mangas e trataram de não deixar morrer o sonho que durante tanto tempo acalantaram, e que somente com muito custo conseguiram transformar em realidade. Para tanto, porém, um novo presidente teria de ser eleito, e com rapidez.

No próximo capítulo de “Nossa História”, você saberá a quem coube a responsabilidade de dirigir o Palestra Itália logo em sua primeira crise.

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Obs.: Esta seção será atualizada em 12/03/2011.

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