CAP. 12: BARRADOS NO BAILE

O Campeonato Paulista viveu sua primeira edição em 1902. Disputado por apenas cinco clubes – São Paulo Athletic, Paulistano, Mackenzie, Germânia e SC Internacional -, o torneio não chamou a atenção de ninguém. E nem poderia: poucos eram os que já haviam ouvido falar em futebol, um esporte “inventado” pelos ingleses que um tal de Charles Miller trouxera para o Brasil poucos anos antes, em 1894.

Nota em jornal informa sobre abertura do Paulistão de 1902

Contudo, o tal Charles Miller do parágrafo acima jogava numa das equipes, e adivinhe qual foi a campeã – claro, só poderia ter sido a que ele defendia. O São Paulo Athletic terminou a competição, disputada no sistema de turno e returno e com pontos corridos, empatado no primeiro lugar em número de pontos e de vitórias com o Mackenzie, mas levou a taça por ter obtido um melhor saldo de gols (16, contra apenas 12 do adversário). Nem precisa explicar por que, em meio a tantos novatos, Miller foi, também, o artilheiro da competição, com 10 gols em oito jogos disputados.

Aos poucos, porém, o Campeonato Paulista foi ganhando consistência e, quando teve início a segunda década do século passado, já levava aos estádios, nas tardes de domingo, um número cada vez maior de fãs. É claro que já existiam as preferências clubísticas, mas o público de então, exclusivamente pertencente à elite paulistana, formada pelos barões do café e pelos primeiros grandes comerciantes e industriais, comparecia aos jogos mais para ver e ser visto. Era o futebol, naquela época, muito mais um evento social do que esportivo.

Como contamos no mais recente capítulo de “Nossa História”, o principal objetivo do Palestra Itália e de seus dirigentes era a participação da equipe no Campeonato Paulista. O detalhe é que, ingênuos, aqueles rapazes tinham a mais plena certeza de que a vitória sobre o Savoia seria motivo mais do que suficiente para que o quadro fosse aceito pela APSA – Associação Paulista de Sports Athleticos (pouco mais tarde denominada APEA) -, principal entidade criada para organizar a competição. É verdade que havia, também, a LPF – Liga Paulista de Football -, uma dissidência do órgão original que, no entanto, já se mostrava agonizante por ter em seu campeonato apenas as equipes mais modestas (a única exceção era o Corinthians).

A certeza de que o Palestra seria aceito no certame não se baseava, contudo, somente na vitória sobre o time de Votorantim-SP. Dois fatores contribuíam para que o time dos italianos pudesse competir: o primeiro era que aquela não fora apenas uma vitória qualquer, mas sim também a primeira derrota do Savoia dentro de casa, desde a sua fundação. Portanto, o time dos rapazes do bairro do Brás colocara fim a uma invencibilidade de 15 anos! A outra questão era de datas: o jogo fora disputado no dia 24 de janeiro, o torneio paulista só começaria em abril e, portanto, havia tempo hábil para a formação de um time efetivo e o atendimento de todas as exigências que pudessem ser feitas por parte da entidade.

Lance da final do Paulistão de 1902, entre Paulistano e SPAC

Assim, crédulos de que tudo daria certo, foram Ragognetti, Marzo e Cervo à sede da APEA, logo na semana seguinte, saber quais os documentos necessários para a filiação da Società Palestra Itália. Lá chegando, os jovens palestrinos rapidamente perceberam que não eram bem-vindos: mesmo tendo ainda a concorrência da LPF, a entidade principal do futebol bandeirante não parecia nem um pouco interessada na inclusão em seus quadros de mais uma equipe sem história e nem força política.

Inicialmente, desconhecedores de que toda a tramitação burocrática já fora feita e de que o Palestra atendia a todas as normas vigentes exigidas a qualquer associação esportiva, dirigentes da APEA solicitaram uma série de documentos do clube e de provas cabais da idoneidade de seus diretores e presidente. Tudo lhes foi entregue. Em seguida, o argumento apresentado foi que a tabela do certame já havia sido feita, aprovada e até publicada nos jornais, mas tal afirmação rapidamente foi rechaçada pelos palestrinos, pois apenas seis equipes participavam do campeonato. Assim, qualquer mudança seria muito simples de ser feita.

A cartada final se dirigiu, então, ao aspecto técnico. Disseram os poderosos de plantão que, se o Palestra Itália quisesse se juntar aos seis times que disputariam o Campeonato Paulista de 1915, teria de provar a sua força contra uma equipe mais forte e mais conhecida do que a do interiorano Savoia. Seria necessário vencer este tal adversário, escolhido pela própria APEA, para provar sua qualidade e só então ser aceito nos quadros da entidade.

Com isso, conseguiu a APEA o que queria: impedir a possibilidade da presença palestrina no certame de 1915, já que caberia ao nosso time arcar com todos os custos deste jogo e, para isso, seriam necessários muitos bailes e festas para a obtenção de mais recursos. Mas o jogo haveria de acontecer, mesmo que vencê-lo significasse a participação apenas no Campeonato Paulista do ano seguinte, 1916.   

Em nossos próximos encontros, vamos contar como se saiu o Palestra na primeira grande decisão de sua vida.

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