CAP. 01: O ESCRAVO E O IMIGRANTE

Brasil, final do século XIX. De repente, a chibata não cortava mais a pele de negras costas como antes por séculos o fizera, nem os braços no canavial e nas plantações de café eram, como antes, tão fortes. A cada dia que passava, crescia a pressão para que a abolição dos escravos se tornasse, enfim, uma realidade também por aqui, como já acontecia em quase todos os demais países do mundo. Fato que envergonha a história da humanidade, a escravidão teve vida longa em nosso País, cujos “coronéis” ditaram as regras da Política enquanto quiseram e adiaram a Lei Áurea o quanto puderam.

Mas já chegava a hora de a sociedade brasileira dar um basta às atrocidades cometidas em nossas fazendas. Intelectuais, jornalistas, empresários e uma boa parcela do povo saíram às ruas exigindo o que hoje parece ser óbvio, mas que naquela época soava como a mais pura perturbação da ordem pública e o mais intenso incentivo à anarquia: a igualdade entre todos os brasileiros, fossem eles brancos ou não.

Haveria, porém, um sério problema a partir do exato instante em que as primeiras correntes de ferro fossem rompidas e o primeiro tronco, mais pelo remorso do que pela podridão, caísse ao solo: numa sociedade amplamente rural, em que as mais tímidas e iniciantes indústrias ainda apenas engatinhavam, quem iria substituir a força negra no plantio e na colheita? Até mesmo os mais ferrenhos abolicionistas temiam que o tempo necessário para a completa transformação do “modus operandi” que reinava em terras brasileiras fosse prejudicial à economia brasileira.

A ideia inicial era que os mesmos negros que até então serviam em regime de escravidão fossem contratados como trabalhadores, recebendo pelos seus feitos. De fato, muitos deles aceitaram esta nova ordem social, mas a maioria preferiu abandonar os cafezais e as roças para desfrutar de uma liberdade sonhada durante toda a sua vida. Após várias gerações, enfim os à época chamados pretos eram livres e, se assim estavam, não havia mais nada que os prendesse às fazendas e, consequentemente, às terríveis lembranças do passado.

Navio Colombo deixa o porto de Gênova, na Itália, em 1869

Temendo pelo futuro do País, as autoridades iniciaram antes mesmo da abolição total da escravidão uma política voltada para o incentivo às imigrações. Campanhas “de boca a boca” foram feitas para que europeus cruzassem o mundo e viessem para o Brasil. Aqui, já dissera o português Pero Vaz de Caminha, “em se plantando, tudo dava”. Nada melhor para os habitantes do Velho Mundo, então lutando com todas as suas forças contra rigorosos invernos e escassez de alimentos, entre outros problemas quase ou ainda mais graves. A ideia deu certo e, aos poucos e cada vez em maior número, aqueles homens, mulheres e crianças de olhos e cabelos claros começaram a sentir na pele os efeitos do nosso Sol.

Santos, 17 de janeiro de 1870. No convés, ainda mareado pelo constante e ritmado balanço da embarcação, Caetano Tozzi estica o pescoço e mira, a quilômetros de distância, o porto da cidade. Dentro de poucas horas, enfim estaria terminada a epopeia que iniciara na Itália, meses antes. Faltava pouco para que seus pés, envolvidos por velhas botinas, pisassem o solo brasileiro. E ele contou cada onda e cada metro que o navio Colombo venceu até conseguir se aproximar do cais.

Carregando nas mãos a puída mala que continha suas poucas e rotas roupas, ele foi se desvencilhando de cada um dos compatriotas que estavam à sua frente e, assim, entrou para a história do País: é dele a primeira assinatura italiana nos serviços paulistas de imigração.

Em nosso próximo encontro, você entenderá como a abolição dos escravos, a chegada dos imigrantes e Caetano Tozzi ajudaram no parto que trouxe à luz o nosso Palestra Itália. 

ATENÇÃO: ESTA É UMA OBRA DE PROPRIEDADE INTELECTUAL, SENDO PROIBIDA SUA DIVULGAÇÃO TOTAL OU MESMO PARCIAL SEM A PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DO AUTOR. OS INFRATORES SERÃO RESPONSABILIZADOS CRIMINALMENTE.

12 Responses to CAP. 01: O ESCRAVO E O IMIGRANTE

  1. Trevisan, como sempre gostaria de parabenizá-lo por mais essa sua iniciativa!

    todos os dias acesso seu site…gostamos muito de você meu amigo.

    Muito Obrigado por nos proporcionar esse conteúdo!

    Abraços , Francesco.

    • Márcio Trevisan

      Eu é que agradeço, Francesco.

      E sábado, logo no primeiro minuto, o capítulo 2 estará no ar.

      Abs.

  2. Junior Colletti

    Boa tarde Márcio!

    Rapaz, só não digo que fico mais ansioso pelas histórias do que pelos jogos porque pareceria exagero!!!

    Mas, você é fera amigo. Que talento!

    No aguardo!!!

    Abraço.

  3. Parabéns…..Amigo Márcio…..

    Ótimo texto……

    E com certeza, a expectativa é a melhor possível….

    Abraços….

  4. Oi Márcio, bom dia
    Parabéns pela ideia de mostrar as origens do nosso Palestra. Tenho interesse em guardar os capítulos, para mostrar, aos meus netos, no momento tenho só duas meninas, mais do jeito que a coisa anda, elas vão se interessar mais do que os rapazes. Já fiz isto com o meu filho, na menina dei uma bobeada e ela virou são-paulina, ele começou a falar uns palavrões (“curintian”) e ai o sangue palestrino, não teve dúvida, o levei a um jogo fácil, o Palmeiras ganhou de 5×0 e com aquelas bandeiras lindas tremulando, ele se salvou e não teve dúvida, hoje além de um torcedor fervoroso, casou-se com uma palmeirense e com certeza vão gerar alguns novos palmeirense que precisam conhecer a origem maravilhosa do nosso verdão. É possível ?

  5. Gostei. Estou aguardando o próximo capítulo.

    Amanhã, Verdão 4×0.

    Avanti, Palestra!

  6. Belo texto!

    Para quem se interessar em saber mais sobre a imigração italiana no Brasil recomendo ler o livro “Brava Gente! Osa Italianos em São Paulo, ALVIM, Zuleika M. F,1986, Editora Brasiliense.

    É um belíssimo livro de História.

    • Em tempo: esse livro aborda a imigração italiana no Brasil entre os anos de 1870 e 1920.

    • Márcio Trevisan

      Obrigado, Roberval.

      E vem mais emoção por aí. Vc se sentirá como se estivesse presenciando os fatos que deram origem ao Verdão.

      Abs.

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